Serviços de advocacia e a reforma tributária

A discussão sobre os impactos da cobrança do IBS/CBS sobre os serviços de advocacia tem gerado bastante controvérsia. Parte da classe dos advogados alega que os honorários teriam um aumento de carga tributária substancial com a cobrança do IBS/CBS àalíquota de 25%. Pelo sistema tributário vigente os serviços jurídicos estão sujeitos ao PIS/Cofins à 3,65% e ao ISS de 2% (o ISSpode ser inferior a 2% quando cobrado por profissional), no caso de empresas do lucro presumido, à 9,25% mais 2% do ISS, nocaso de empresas que adotam o lucro real. As sociedades de advogados também podem optar pelo Simples Nacional.

Utilizando os dados da Receita Federal para 2018, fazendo a pesquisa para o CNAE 6911 (Atividades Jurídicas), verificamos que emtermos de receitas, 56% são registradas por empresas do lucro presumido, 11% pelas empresas do lucro real e 33% por empresas tributadas pelo Simples. Em termos de empregados, as empresas do Simples empregam 43%, as tributadas pelo lucro presumido 46% e as empresas que optam pelo lucro real empregam apenas 11% do total.

O impacto do IBS/CBS depende do atual regime tributário da empresa de advocacia e se o serviço está sendo prestado paraempresas sujeitas ao IBS/CBS (meio da cadeia produtiva) ou se o cliente é pessoa física ou não contribuinte do imposto.

As empresas do Simples (33% das receitas do setor) não terão a tributação alterada pela reforma tributária, exceto pela possibilidade de gerar crédito quando estão no meio da cadeia. O crédito, que não é permitido pelo sistema vigente,corresponderá a parcela do Simples relativa ao IBS/CBS.

As empresas do lucro real e do lucro presumido que estejam no meio da cadeia não serão afetadas pela reforma tributária, umavez que geram crédito para empresas que são tributadas pelo IBS/CBS. Através da Tabela de Recursos e Usos (TRU) do IBGE de2017 é possível identificar que apenas 8% dos serviços jurídicos são consumidos pelas famílias, 5% são exportados e os 87%restantes são serviços prestados a outras empresas (o código pesquisado – 69801 – inclui também serviços de contabilidade e deconsultoria). Levando em conta que exportação não será tributada, podemos afirmar que 92% dos serviços jurídicos não são afetados pela reforma tributária. Esse número pode ser um pouco menor, pois temos pessoas jurídicas que também serão consideradas consumidores finais, tais como condomínios, fundações e outras entidades não sujeitas ao IBS/CBS.

Em relação aos serviços prestados às pessoas físicas é importante entender quem são os consumidores desses serviços.Utilizando-se da Pesquisa de Orçamento Familiar realizada pelo IBGE (POF 2017/2018), verificamos que 69,45% do gasto comserviços jurídicos é realizado pelos 30% mais ricos. Os 10% mais pobres consomem apenas 1,35% do total do gasto das famíliascom esses serviços. Portanto, eventual aumento de preço decorrente do IBS/CBS pouco afetará as classes mais baixas de renda.

O tamanho do impacto no caso dos consumidores finais pode ser calculado utilizando-se a pesquisa de serviços do IBGE (PAS2019). Usamos os números relativos a empresas do setor com mais de 20 funcionários, excluindo boa parte das empresas do Simples. Utilizando-se a alíquota de IBS/CBS de 26,9% teríamos uma variação de aproximadamente 10% nos preços cobrados.Refazendo o modelo somente para empresas do lucro presumido, teríamos uma variação de 13,24%. Essa simulação usou comoprincipal hipótese o repasse total aos preços do aumento de carga gerada pelo IBS/CBS.

Adicionalmente, cabe explicar o porquê as empresas advocatícias que estejam no meio da cadeia não sofrem impacto no preçoem razão do IBS/CBS. Para facilitar o entendimento vamos utilizar um exemplo. Inicialmente vamos supor uma empresa sujeita hipoteticamente a uma alíquota do ICMS de 25% (cobrada por fora, para facilitar o exemplo) na revenda de sua mercadoria. A mercadoria é comprada por 60, a empresa gasta 15 de mão de obra, 5 com serviços de advocacia e revende o item por 100, tendoum lucro de 20.

A incidência do ICMS se daria sobre 40 (100-60), visto que não há crédito sobre salários (15), sobre serviços de advocacia (5) e sobre lucro (20). O imposto devido seria igual a 10 (25% x 40). Na prática a tributação se deu sobre a mão de obra(15), lucro (20) e, surpreendentemente, sobre os serviços de advocacia (5). O serviço de advocacia quando não gera crédito é tributado novamente pela empresa que contrata o serviço. Nesse caso, os serviços advocatícios sofrem dupla incidência,inicialmente quando o imposto é pago pelo próprio escritório de advocacia (5,65% =3,65%+2%) e, posteriormente, pela tributação adicional de 25% do ICMS da empresa contratante.

O que aconteceria em um regime do IBS/CBS (alíquota de 25%)? Usando o mesmo exemplo, a sociedade de advogados iria destacar 25% sobre o valor do serviço (1,25 = 5 X 25%). Já a empresa comercial, que terá direito ao crédito do imposto pago pelaadvocacia, ao apurar o IBS/CBS fará seguinte cálculo: 100 – 60 – 5 = 35. O valor de 35 corresponde aos salários (15) mais os lucros(20). O serviço de advocacia não é tributado novamente pela empresa comercial. Logo ao invés de pagar 5,65% mais 25%, a empresa prestadora de serviço só pagará 25%. Por essa razão, as empresas do setor advocatício que prestam serviços no meio da cadeia poderão até reduzir os preços.

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