Tribunais estaduais mantêm validade de contratos de franquia

Os tribunais estaduais brasileiros têm decidido a favor da manutenção das cláusulas contratuais que definem onde eventuais conflitos entre franqueadores e franqueados devem ser resolvidos. Desde julho de 2024, uma nova legislação trouxe requisitos obrigatórios para a chamada “eleição de foro”. Se descumpridos, a prática pode ser considerada “abusiva”.

Um levantamento do BMA Advogados analisou 70 decisões judiciais sobre o assunto, proferidas entre julho de 2024 e maio de 2025, e mostra que 73% delas mantiveram a disposição contratual. Foram verificadas decisões de 14 tribunais estaduais.

A Lei nº 14.879/2024 alterou o artigo 63 do Código de Processo Civil e passou a exigir que a eleição do foro seja formalizada por escrito, que a cláusula mencione o negócio jurídico específico a que se refere e que o local tenha relação com as partes ou com a atividade realizada.

Desde que a legislação entrou em vigor, franqueadores temeram que todos os contratos tivessem de ser alterados ou que franqueados levassem o assunto ao Judiciário. O franchising brasileiro reúne mais de 197 mil operações, cerca de 3,3 mil marcas e movimentou em 2024 cerca de R$ 273 bilhões, gerando mais de 1,7 milhão de empregos diretos.

Segundo o levantamento, apenas 24% das decisões analisadas abordaram diretamente a reforma legal e o artigo 63. Para o desembargador Roberto Maia, do TJSP, demandas ajuizadas após a lei devem seguir as novas regras, independentemente da data da cláusula de eleição de foro. Ele destacou que ajuizar ações em juízo aleatório passou a ser considerado prática abusiva (agravo nº 2295795-78.2024.8.26.0000).

Tatiana Dratovsky Sister, sócia do BMA Advogados, explicou que muitos clientes queriam saber se “a lei pegou”. Ela afirma que, apesar de existir uma corrente jurídica que considera o franqueado vulnerável, na prática os tribunais têm entendido o contrário. Dos 70 acórdãos analisados, a maioria veio de São Paulo (19), Santa Catarina (15), Rio de Janeiro (7) e Paraná (7).

Os principais fundamentos para manter a cláusula foram: inexistência de partes vulneráveis (31 decisões), aplicação da Súmula 335 do STF (27), entendimento de que contratos empresariais são sempre válidos (25), manutenção do foro não prejudica acesso à Justiça (24) e princípio “pacta sunt servanda” (18).

Em março de 2025, a 20ª Câmara de Direito Privado do TJSP decidiu nesse sentido, afirmando que a escolha do foro está no âmbito das estratégias empresariais e que franqueados não são hipossuficientes (agravo nº 2025649-59.2025.8.26.0000).

Tatiana conclui que, para contratos antigos, se não houver vulnerabilidade e o acordo for de natureza empresarial, a cláusula pode ser mantida. Para novos contratos, recomenda já seguir as exigências da Lei nº 14.879/2024.

Natan Baril, diretor jurídico da ABF, afirmou que a alteração da lei trouxe um filtro importante contra foros aleatórios, mas pode gerar instabilidade contratual e aumentar a litigiosidade. Segundo ele, preservar cláusulas quando há pertinência reforça a autonomia privada, dá segurança jurídica e previsibilidade às redes de franquia. Para Baril, franqueado não é parte vulnerável e a franquia é um contrato de padrão empresarial, não de consumo.

Fonte: Valor Econômico

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