STJ valida em repetitivo Selic para correção de dívidas civis

Entendimento firmado pela Corte Especial passa a ser vinculante e deve ser seguido por todo o Judiciário

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou que a Selic é a taxa a ser aplicada na correção de dívidas civis e indenizações. O assunto já havia sido decidido pelo colegiado em agosto de 2024, mas agora o julgamento ocorreu sob o rito de recursos repetitivos. O entendimento passa a ser vinculante e deve ser seguido por todo o Judiciário. A decisão foi dada na sessão de quarta-feira.

Cerca de seis milhões de processos são afetados. A tese é aplicada para todas as situações em que a correção não for previamente estabelecida, como em pedidos de indenização que não decorrem de relação contratual — por acidentes ou danos ambientais, por exemplo — ou dívidas de contratos sem índice definido.

O tema já foi decidido pelos ministros da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) no mês passado (RE 1558191) e foi pacificado com a Lei nº 14.905, de 2024. Os devedores saem vitoriosos com o entendimento.

Defendem a Selic porque, na prática, o valor da dívida fica cerca de 30% menor ao longo do tempo se comparado à taxa de 12% ao ano e correção monetária que era usada pelos tribunais — cada um com sua regra, aplicando em maioria o IPCA. Hoje, os percentuais estão próximos, mas a Selic já esteve mais baixa, chegando a 2% durante a pandemia da covid-19.

Ao contrário do julgamento de março de 2024 no STJ — acirrado e decidido pelo voto de desempate da presidência —, o desta semana foi unânime. Não houve discussões, em razão da pacificação jurisprudencial e da mudança legislativa. A decisão é vista como positiva por advogados, pois evita novos recursos ao tribunal superior e decisões conflitantes (REsp 2199164).

A discussão se baseia no artigo 406 do Código Civil, que determina que os juros moratórios, se não previstos em contrato, serão fixados pela taxa em vigor para o pagamento de impostos devidos à Fazenda. A Lei nº 14.905/2024 alterou esse dispositivo, estabelecendo regras para a atualização monetária e a aplicação de juros em casos de inadimplência.

Pela nova norma, são aplicados, respectivamente, IPCA e Selic. Para o cálculo dos juros, deve ser deduzido o índice de atualização monetária. Se a diferença for negativa, a taxa de juros considerada será zero no período — evitando, assim, dupla atualização monetária.

No julgamento, prevaleceu o voto do relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que lembrou que a Selic é a taxa aplicada no atraso de pagamento de impostos federais. Fixar parâmetro diferente para juros civis, segundo ele, viola o artigo 406 do Código Civil e “causa impacto macroeconômico”.

“A lei prevê que os juros moratórios civis sigam a mesma taxa aplicada à mora de impostos federais, garantindo harmonia entre obrigações públicas e privadas”, afirmou o ministro.
“A Selic, por englobar juros de mora e correção monetária, evita a cumulação de índices distintos, garantindo maior previsibilidade e alinhamento com o sistema econômico nacional”, completou.

O STJ fixou a seguinte tese:

“O artigo 406 do Código Civil de 2002, antes da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, deve ser interpretado no sentido de que é a Selic a taxa de juros de mora aplicável às dívidas de natureza civil, por ser esta a taxa em vigor para a atualização monetária e a mora no pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.”

O caso julgado trata de uma sentença em que uma credora tenta executar, desde 2005, uma dívida contra um hospital de R$ 20 mil. Para a correção, haviam sido aplicadas as médias do INPC e do IGP-DI, somadas a juros moratórios de 1% ao mês. Em 2020, o valor atualizado alcançava R$ 140,2 mil. O TJPR rejeitou a aplicação da Selic, mas ela foi restabelecida pelo STJ.

Segundo Marcos Velloza, sócio do Velloza Advogados, embora o tema já estivesse pacificado no STJ, tribunais estaduais ainda aplicavam a taxa de 1% ao mês.

“A fixação do Tema 1368, agora obrigatoriamente seguido por todos os juízes e tribunais, contribuirá para maior celeridade nas decisões e proporcionará segurança jurídica às partes, evitando decisões díspares e o envio desnecessário de recursos à Corte Superior”, afirma.

No julgamento do ano passado, antes da publicação da Lei nº 14.905/2024, o debate na Corte Especial foi intenso. O relator ministro Luís Felipe Salomão — voto vencido — defendia juros de 1% ao mês mais correção monetária, conforme o índice adotado pela tabela de cada tribunal. Já o ministro Raul Araújo, voto vencedor, argumentou que aplicar essa tese resultaria em remuneração muito superior à de qualquer investimento financeiro, pois os bancos se orientam pela Selic.

“Não há razão para impor uma taxa tão alta ao devedor”, concluiu Araújo (REsp 1795982).

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