Influenciadores financeiros e o mercado de capitais

O número de brasileiros que aplicam seus recursos em renda variável vem aumentando no país. De acordo com oúltimo levantamento promovido pela B3, cerca de 4,6milhões de pessoas físicas investem nesse específico segmento, e o produto mais negociado foram as ações de companhias abertas e listadas na bolsa de valores.

Não há dúvida de que esse crescimento está vinculado à educação financeira e à segurança jurídica, garantida por um marco legal consistente que prevê, dentre outras coisas, o crime de manipulação de mercado de capitais e de uso de informação privilegiada. A ideia é que todos os participantes do mercado negociem com base nas mesmas informações, sem que alguns tenham acesso a dados exclusivos sobre fatos relevantes de empresas e suas perspectivas de negócio.

A multiplicação de corretoras de investimentos facilitou o acesso dos investidores à bolsa de valores, que, por meio de aplicativos instalados em seus próprios smartphones, conseguem comprar e vender ações numa fração de segundo. 

Nesse cenário, surge um novo personagem: o influenciador digital. Aquele que usa redes sociais para disseminar suas opiniões para o mercado, indicando investimentos, sugerindo operações, criticando e elogiando ativos mobiliários ou empresas. São pessoas capazes de influenciar comportamentos, fomentar ideias e servir de fonte de informações para os seus seguidores em determinado assunto ou área.

 

Quando bem-intencionados, contribuem para a popularização do setor e para a diversificação dos investimentos. Quando mal, podem ser instrumentos de manipulação de mercado, em especial se usam suas redes e influência para propagar informações falsas, incompletas ou distorcidas a um número grande de pessoas em pouco tempo, prejudicando incautos e beneficiando operadores que já conheçam as opiniões que serão apresentadas ao público em geral.

Segundo a CVM, cerca de 75% de investidores que passaram a operar no mercado de valores mobiliários deram início a essa empreitada depois que assistiram a canais de youtubers e a outras formas de conteúdo disponibilizados por influenciadores financeiros. E não têm sido poucos os casos de pessoas que perderam grande parte do patrimônio familiar em razão de investimentos mal sucedidos em operações materializadas no mercado de renda variável, como o de ações, depois de receber informações de pessoas desprovidas de conhecimento apropriado para explicitar com clareza e segurança a modalidade de investimento propugnado livremente em suas redes sociais.

É preciso atenção para o fenômeno, e buscar formas de enfrentar ouso das redes sociais para distorcer dados e manipular o mercado. A divulgação de informações sobre os cuidados que devem ser tomados ao investir em títulos mobiliários e afins, as fontes seguras de informações, o funcionamento dos órgãos reguladores, é um primeiro passo, para evitar engodos e orientações falsas.

Mas é preciso ir além da prevenção. Parece importante a fiscalização e repressão à atividade daqueles que usam de sua influência digital para obter ganhos indevidos no mercado de capitais. A Securities and Exchange Commission, órgão equivalente a Comissão de Valores Mobiliários, nos Estados Unidos da América, atenta a esta realidade, tem investigado tais influenciadores, e descoberto em alguns casos esquemas envolvendo informações fraudulentas disseminadas por plataformas e mídias sociais, propaladas por pessoas que se autoproclamavam influenciadores financeiros, e nessa qualidade auxiliaram gestores de fundos e ativos a desgastar a imagem deconcorrentes, obtendo vantagens para si e para terceiros.

A CVM segue a mesma linha. No Brasil, a manipulação de mercados écrime, com pena de 1 a 8 anos de prisão. Para fiscalizar os influenciadores digitais e identificar a possível prática do delito, existeum convênio entre a autarquia e a Associação Brasileira das Entidadesdos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). O Ministério Público Federal e a Polícia Federal têm investigado condutas de manipulação de mercado por parte de influenciadores digitais, identificando em muitos casos esquemas sofisticados em que o uso das redes é instrumento de manipulação de mercado por meio da divulgação dolosa de informações sabidamente falsas.

São os primeiros, e importantes, passos. É preciso reconhecer que omundo digital apresenta desafios, e se queremos um mercado mobiliário seguro e transparente, é preciso enfrentá-los. Reconhecer os riscos de manipulação na conduta de influenciadores digitais e buscar formas de inibir o uso das redes sociais para a obtenção de vantagens indevidas nesse terreno, é, com efeito, um caminho que deve ser seguido, e por isso a importância das medidas que vêm sendo adotadas pela CVM nesse mercado.

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